sábado, 16 de maio de 2009

ENTREVISTA - VINICIUS MADAZIO - NÚCLEO UNIÃO PRÓ-TIETÊ


Vinicius Madazio – Formado em Comunicação Social pela ESPM e Geografia pela USP. Educador Ambiental, atua na área desde 1997 e possui experiência em projetos desenvolvidos por ONGs ambientalistas e também na formação de professores, educadores e agentes multiplicadores. Na Fundação SOS Mata Atlântica, junto com Maria Luiza Ribeiro, é responsável pelo Programa Núcleo União Pró-Tietê e Observando o Tietê e pelo site Rede das Águas, braço da Fundação SOS Mata Atlântica na questão dos recursos hídricos.

Vinicius Madazio concedeu esta entrevista em 08 de Maio de 2009, na sede da Fundação SOS Mata Atlântica.

Por João Elias
Foto: João Elias

O1- Fale um pouco sobre o Núcleo União Pró-Tietê e como tudo começou?
Bem, em 1991, a Rádio Eldorado em conjunto com a BBC de Londres, fizeram um programa para falar da situação do Tietê, comparando com o Rio Tâmisa, em Londres, o qual já foi poluído e voltou a viver. Um repórter em cada rio, trocando informações e impressões.
A participação da sociedade impressionou, muitas ligações para a Rádio, muitos telefonemas, telegramas, cartas, enfim, todos querendo participar com idéias, críticas e sugestões e diante dessa grande resposta da população, a SOS Mata Atlântica criou o Núcleo União Pró-Tietê.
Junto com a Eldorado, resolveram então documentar esta manifestação, o que gerou um abaixo assinado de mais de 1.200.000 assinaturas, todos pedindo por atitudes em relação ao Tietê.
Com este documento em mãos, o Governo foi pressionado e se viu obrigado a dar uma resposta e nasce o “Projeto Tietê”, o maior projeto de saneamento, visando à despoluição do Tietê, um Projeto sob a responsabilidade da Sabesp – Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo.

02- Quais as responsabilidades do Núcleo União Pró-Tietê ? Como é sua atuação?
O Núcleo União Pró-Tietê é o parceiro do Projeto Tietê e ficou responsável pela educação ambiental e conscientização da sociedade e em 1993, já monitorava a água do Rio Tietê em 70 municípios.
Sabíamos que para o sucesso de um projeto deste porte seria necessário o envolvimento e participação da sociedade e foi idealizado um novo programa, o “Observando o Tiete”, para que as pessoas voltassem a entender o rio e percebessem os seus encantos e a sua importância.
A mobilização utiliza o monitoramento da qualidade da água dos rios como instrumento de sensibilização e inclusão social na gestão integrada dos recursos hídricos.
Hoje são aproximadamente 150 grupos, espalhados por todo o Estado de São Paulo, formados principalmente por alunos, professores, diretores de escolas, lideranças comunitárias, Ong’s, pesquisadores, enfim, todos voluntários, unidos e mobilizados em defesa do meio ambiente.
Os grupos se relacionam, trocando informações e experiências e periodicamente tem a oportunidade de se encontrarem nos eventos que realizamos.
Cada grupo é composto por várias pessoas e eles vão aumentando dia a dia e o mais importante é saber que somos muitos e estamos crescendo, nos multiplicando.
Os grupos voluntários recebem um curso/palestra de capacitação e kits completos de análise da água, os quais chegam a resultados confiáveis, muito próximos aos realizados em laboratórios.
São 150 pontos do Tietê em observação, desde a nascente até a sua foz e esses grupos fazem a coleta mensal da água, fazem a análise e enviam os resultados via internet, alimentando o banco de dados central do programa, à disposição no site www.rededasaguas.org.br
Pelo teste é analisado o oxigênio dissolvido, o nitrogênio amoniacal, fosfato, potencial hidrogeniônico, a demanda química em oxigênio, coliformes totais, coliformes fecais e ph.
Com este programa, parte da sociedade se mantêm envolvida e mobilizada e participam de forma ativa no processo da recuperação.

03- Hoje é dito que o principal poluidor do Tietê deixou de ser as indústrias e passou a ser o esgoto residencial sem tratamento e o lixo jogado nas ruas. No que se refere a educação ambiental, é percebido resultados positivos nas regiões onde estão atuando ? Estão conseguindo a mudança de atitudes e hábitos? As famílias tem cuidado melhor do lixo, tem optado pela reciclagem e coleta seletiva?
A população tem sim uma grande parcela de culpa na atual situação do rio, mas a mudança de costumes é muito complicada e muito lenta.
O tema tem uma importância vital e mereceria uma atenção maior do poder público e da mídia e aí sim, com campanhas periódicas, teríamos mudanças mais perceptíveis, em uma escala muito maior e não apenas atingindo os grupos ambientalistas que estamos formando.
As grandes empresas, os bancos estão cada vez mais se envolvendo com os problemas do meio ambiente e temos visto campanhas em todos os veículos, porém, todas falando em salvar o planeta e algumas adotando a defesa da Amazônia.
Essas empresas estão disseminando a idéia da reciclagem, usando papel reciclado, enfim, isto já é bastante positivo.
Quanto ao Tietê especificamente, infelizmente não temos visto nada, pois se existissem campanhas publicitárias neste sentido, os resultados e a conscientização aconteceriam mais rapidamente e seriam mais perceptíveis.

04- Na Capital de São Paulo, ainda nos deparamos com muita sujeira pelas ruas, córregos e rios. O Núcleo atua forte na Capital? Se sim, porque os resultados não são expressivos?
Como mencionamos, precisaríamos de uma maior participação do poder público e da mídia para atingirmos a sociedade.
Quando se fala em São Paulo, os números são astronômicos e é muito difícil resultados práticos apenas com os eventos e ações que realizamos.

05- Passados 17 anos do lançamento do Projeto Tietê, como o Núcleo analisa os resultados já obtidos?
Bem, as mudanças realmente estão acontecendo, novas estações de tratamento de esgotos construídas e algumas em construção, milhares de ligações de esgotos foram feitas e tudo sendo enviado para as estações e isto já é percebido no rio, na qualidade da água que analisamos mensalmente.
Sabemos que o Projeto Tietê terá que ser um programa contínuo, pois à partir do momento que as obras forem finalizadas ainda vai demorar um tempo para o rio voltar a viver.
Depois de vivo, as cidades continuarão crescendo, novas casas e prédios construídos, novas empresas, enfim, o poder público terá que continuar fazendo as ligações para coleta de esgoto e o devido tratamento.

06- Quanto a qualidade da água analisada pelo Núcleo, os resultados são satisfatórios? Que dados poderiam nos fornecer?
Sim, como mencionamos, estamos percebendo que realmente a qualidade da água do Tietê no interior está melhorando gradativamente, resultado já do Projeto Tietê.
As aves estão voltando, os peixes estão surgindo em pontos que não existiam mais, enfim, está tudo dando certo.
A população também precisa fazer a sua parte e colaborar não jogando lixo no rio, nas ruas, nos córregos e se conectando a rede de coleta de esgotos.

07- O que seria necessário neste momento para acelerarmos os resultados positivos?
Nos pontos onde são retiradas sujeira do Tietê, percebe-se que 30% do material é lixo que certamente foi jogado pelas ruas ou diretamente no rio; garrafas pet, pneus, papel, sacolas plásticas, embalagem de doces e salgadinhos e até animais domésticos mortos.
Quanto a coleta de esgotos, a população precisa se conectar a rede de esgotos e aqueles que ainda não tem ligação deveriam aderir e não o fazem porque sabem que a conta de água irá dobrar.
A Sabesp cobra a água que fornece e sabendo que ela retornará como água usada, água suja e esgoto, cobra também pela coleta.
No caso das classes menos favorecidas em São Paulo, a Sabesp poderia pensar em subsídios, estímulos para que um número maior aderisse.
É importante saber que cada R$ 1,00 gasto em saneamento, se economiza R$ 5,00 com saúde, portanto, é melhor gastar com saneamento do que com internações e medicamentos.
Agora, o problema não ocorre só com a classe menos favorecida não, pois tem grandes condomínios que optam por fossas nos seus terrenos.
Periodicamente contratam empresas para recolherem os dejetos e aí é que começa o problema, pois nem todas empresas são sérias e levam esses dejetos até as estações de tratamento, despejando em qualquer córrego pelo caminho.

08- A imprensa tem noticiado que em Itú e Salto já tem peixes. Esta informação é verdadeira?
Sim, sabemos que na cidade de Salto os peixes já estão voltando e se reproduzindo naquele trecho do Tietê e os pescadores já voltaram a atividade, paralisada em 1990, porém, consideramos isto um risco, pois a água naquela região ainda tem uma carga muito grande de poluentes, o que contamina os peixes, tornando a carne imprópria para o consumo humano.

09- Também saiu na imprensa que a mancha de poluição do Tietê está recuando. O Núcleo confirma esta informação?
Sim, a informação é real e a mancha já recuou até a Cidade de Anhembi e Salto e a tendência agora é ir recuando gradativamente e limpando o rio por completo.

10- Dizem que em 2011 ou 2012 já teremos peixe no rio Pinheiros. O Núcleo acredita nesta afirmação?
Não, este é um prazo muito curto e não acreditamos quem em dois ou três anos o Pinheiros volte a ter vida. Muita coisa ainda tem que ser feita e por enquanto acreditamos que somente as capivaras darão o ar da graça naquelas águas.

11- Além do Alto Tietê, o Núcleo acompanha a qualidade da água nos demais mananciais da Grande São Paulo, Guarapiranga, Billings e Cantareira?
Sim, tem grupos em cada um desses locais e estamos sempre nos envolvendo em campanhas, principalmente na Guarapiranga e Billings, as duas com maior problema de moradias irregulares.
Nas duas represas a qualidade da água vem piorando ano a ano, tendo em vista este aumento populacional, lixo e esgoto despejados diretamente nas suas águas.
No Alto Tietê a situação está sob controle, porém, os organismos tem que ficar de olho, pois em regiões próximas a Cantareira, iniciou-se uma especulação imobiliária e muito esgoto e lançado nos córregos sem nenhum tratamento.

12- O que o Núcleo poderia dizer quanto ao descaso com os mananciais, onde hoje a população mora praticamente dentro das represas Guarapiranga e Billings? O que deveria ser feito?
Na Guarapiranga já são mais de 800 mil pessoas no seu entorno e na Billings mais de 1 milhão e 200 mil pessoas.
Tardiamente, as autoridades estão tomando as providências e tirando essas pessoas dessas áreas, realocando em outros pontos da Cidade.

13- Quanto ao Projeto Tietê e as afirmações de que na Região Metropolitana de São Paulo, o Rio estará despoluído em 25 ou 30 anos. O Núcleo acredita nesta prazo?
Provavelmente o prazo será bem maior, pois ainda tem muita coisa a ser feita e a sociedade precisa fazer a sua parte.
A Sabesp fazendo a sua parte, coletando e tratando pelo menos 90% do esgoto residencial e industrial que chega ao Tietê, já resolverá boa parte do problema.
Feito isto, o rio não terá o mau cheiro de hoje, a água estará bem mais limpa, mas ainda terá muita sujeira, principalmente aquelas jogadas pelas ruas ou diretamente no rio.
Talvez isto mude dentro de uns 10 ou 15 anos, quando a população perceber que realmente o rio estará ressuscitando e neste momento, acreditamos que o envolvimento da mídia e da sociedade será maior.
O Governo e Prefeitura da época, certamente lançarão campanhas neste período e algumas empresas se envolverão e desta forma sim, tocará a população e ela irá participar mais efetivamente, pois perceberá os benefícios que o rio trará para as Cidades e para elas próprias.
Acreditamos que em 25 anos, em São Paulo o rio já uma água mais limpa, já poderá ter alguns peixes e poderemos ter alguns atrativos como passeios de barcos por exemplo, agora, ainda será impróprio para o nado e para a pesca por exemplo.

Postado por João Elias em 10 de Maio 2009

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